O líder da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, maior partido da oposição que o MPLA (ainda) permite em Angola, e membro integrante da Frente Patriótica Unida anunciou hoje a formalização, terça-feira, deste novo projecto político, do qual fazem também parte o Bloco Democrático e o político Abel Chivukuvuku.
O anúncio foi hoje feito por Adalberto da Costa Júnior, em declarações à imprensa, no final de uma reunião orientada por Abel Chivukuvuku, coordenador geral do movimento político PRA-JA Servir Angola, da qual fez também parte Filomeno Vieira Lopes, líder do Bloco Democrático.
“A Frente Patriótica Unida vai ser formalizada na próxima terça-feira”, anunciou o líder da UNITA, salientando que “é o culminar de um longo processo de negociação, de conversas”.
Segundo Adalberto Costa Júnior, os documentos fundamentais estão terminados, estando assim “em condições de corresponder à enorme expectativa que está direccionada por parte de todos os angolanos”.
Adalberto da Costa Júnior remeteu também para terça-feira o anúncio do nome de quem ficará à cabeça da Frente Única Patriótica.
Na reunião da Comissão Directiva provisória nacional do projecto político PRA-JA Angola, que contou com a participação de mais de 250 membros de todas as províncias angolanas foi apreciada e decidida a utilidade patriótica, viabilidade e modalidades da sua participação, “na busca de alternância do poder político em Angola” da Frente Patriótica Unida.
Os membros aprovaram o princípio de adesão do PRA-JA Servir Angola à Frente Patriótica Unida, tendo para o efeito aprovado com emendas o memorando de entendimento e o Acordo sobre os princípios e normas de funcionamento da Frente Patriótica Unida.
A comissão directiva provisória aprovou também o princípio de flexibilidade em função de eventuais ajustamentos posteriores, “tendo congratulado e felicitado os parceiros originais da tripartida, nas pessoas de Adalberto da Costa Júnior e Justino Pinto de Andrade, que durante cerca de dois anos interagiram com a direcção do projecto político PRA-JA Servir Angola, liderado por Abel Chivukuvuku por uma nova visão, um novo projecto patriótico e uma nova ambição para Angola”.
Na sua intervenção, Adalberto da Costa Júnior frisou que a consulta hoje feita aos membros do PRA-JA Servir Angola foi igualmente feita no seu partido, debatendo nas suas instituições, comité permanente, comissão política e o congresso a formatação da ampla frente para a alternância democrática em Angola.
“Este é um sinal que vem dos partidos que têm a democracia como um valor político, que têm a necessidade da transparência, da boa governação, como um valor político que se deve transferir para a governação”, referiu.
Segundo Adalberto da Costa Júnior, “só partidos democráticos têm condições de governar em democracia”, apologia que fez para dizer que, “infelizmente” em Angola “a governação actual é interpretada por um partido não democrático, que não pratica a pluralidade na legitimação das suas lideranças”.
“Gostaríamos muito de ver, como elemento muito positivo, que até ao final deste ano, no exercício dos congressos que se realizem nos partidos políticos todos deste país, mas com incidência para aqueles que têm a responsabilidade de governação, que a pluralidade seja um compromisso”, disse.
Por sua vez, Abel Chivukuvuku deixou um apelo aos angolanos, para que possam “sem equívocos” ter “confiança na UNITA e no seu presidente, Adalberto da Costa Júnior”.
“Os angolanos podem e devem ter confiança e esperança no Bloco Democrático e no seu presidente, Filomeno Vieira Lopes. De mim não preciso de falar, a minha vida prova, não vos defraudei no passado, não vos defraudarei hoje nem amanhã”, afirmou.
Abel Chivukuvuku disse que a Frente Patriótica Unida tem pela frente quatro desafios imediatos, nomeadamente a sua formalização, estruturação, preparação da pré-campanha eleitoral e o encorajamento de todos os angolanos a votar nas eleições gerais de 2022.
Já Filomeno Vieira Lopes defendeu que todos devem mudar de posição: “Aqueles que estão no poder devem ir descansar para a oposição, nós devemos agora passar a outra posição. A mudança é um imperativo nacional”.
No comunicado final do encontro, foi endereçada “uma palavra de conforto ao MPLA (partido no poder há 46 anos) e à sua liderança, porque mudança é um processo natural inerente a todos os fenómenos sociais”.
Recorde-se que Angola vive hoje (em bom rigor, vive há quase 46 anos) uma degradação progressiva ante a incapacidade do Governo do MPLA de reverter o quadro de penúria generalizada que a esmagadora maioria das famílias angolanas enfrenta.
O País está falido, doente e sem rumo. A juventude, que é o futuro da Nação, sente-se traída e impotente, porque os governantes, ao invés de governarem para o povo, roubaram o País e roubaram também o futuro da juventude.
No Sul, aldeias inteiras assistem o êxodo das suas populações assoladas pela fome e pela falta de água que agravam a pobreza e semeiam a morte, como o Folha 8 demonstrou em algumas das suas mais recentes reportagens. Nos centros urbanos, o preço galopante dos alimentos faz as suas vítimas, e a classe média que há alguns anos atrás brotava vai minguando.
Os preços dos alimentos da cesta básica sobem todos os dias sem qualquer controlo. O preço do açúcar, mesmo o produzido em Malange, por exemplo, continua a ser manipulado a favor dos cartéis e contra os interesses do povo desprotegido por quem o devia proteger.
Não se compreende que mesmo quando o câmbio do dólar se mantém inalterado e a oferta de produtos nacionais aumenta, os preços desses produtos continuem a aumentar a um ritmo superior à taxa da desvalorização da moeda, em violação das leis do mercado.
A incapacidade do governo de resolver os problemas sociais tornou-se estrutural e congénita, tendo transformado a falta de água potável, as doenças endémicas, o desemprego, a educação sem qualidade, a falta de saneamento básico, a incompetência do governo e a corrupção em verdadeiros inimigos do povo angolano.
Para agravar a situação, o Partido Estado/MPLA capturou o Estado, subverteu a democracia e delapidou os recursos do País para beneficiar meia dúzia dos seus oligarcas.
Prova disso é a persistência na contratação directa das mesmas empresas para as principais empreitadas de obras públicas, quando a maioria das construtoras que outrora empregavam milhares e milhares de cidadãos e lhes mitigavam a fome, asfixiadas pelo não pagamento da divida pública vão minguando no esquecimento.
A conduta desviante de quem governa, que não escuta os seus parceiros sociais, não dialoga sequer com os partidos fora da sua órbita, cria uma crise insanável na relação entre governantes e governados, que obriga a Nação a rever os fundamentos da relação intrínseca existente entre responsabilidade política e legitimidade governativa.
O republicanismo ensina que a responsabilidade política dos governantes constitui o fundamento das obrigações políticas dos cidadãos, no sentido em que as regras de conduta responsável a que os governantes estão vinculados são também regras de legitimidade política.
Quando os governantes quebram tais regras, tomando decisões que lesam manifestamente o bem da comunidade ou quando praticam crimes, isso significa que as condições que tornariam o seu poder legítimo e válido se desfizeram.
Nesta base, o Partido Estado/MPLA perdeu a legitimidade política para continuar a governar Angola. De facto, o republicanismo e a democracia representativa, não permitem o exercício do poder representativo sem responsabilidade.
A responsabilidade é uma condição da democracia, tal como a democracia é uma condição da responsabilidade. O povo admite apenas a cedência do seu poder aos seus governantes porque conserva a oportunidade de os vigiar e de os remover.
É convicção generalizada (até mesmo de muitos angolanos do MPLA) que o Partido Estado MPLA perdeu a legitimidade política para continuar a governar Angola por manter o Estado capturado, asfixiar as liberdades democráticas, manter de alguma forma a corrupção e manter a economia refém de interesses hegemónicos, solidamente entrincheirados nas esferas do poder e por ter passado a governar contra os interesses do povo soberano de Angola.
Angola precisa de adoptar um Programa de Emergência Nacional para tirar o País da crise em que se encontra. A fome, a saúde, a educação, o desemprego, a habitação e a criminalidade tornaram-se problemas de segurança nacional e precisam de ser tratados como tal.
Os angolanos querem governantes que sejam patriotas, que amem o povo, respeitem a Lei e não sejam corruptos. Não querem governantes que estejam comprometidos em salvar os seus partidos, mas governantes comprometidos em salvar Angola e os Angolanos.
O tempo da democracia tutelada, para perpetuar no poder alguns e excluir outros, tem de acabar. Ou acaba ou Angola morre. Também tem de acabar o tempo da República sem republicanismo; o tempo da democracia sem liberdade de imprensa; o tempo de todos ficarem amordaçados à vontade de uma só pessoa.
O problema não está na filiação política das pessoas. Está nas práticas erradas e na incapacidade dos dirigentes de governar para o povo, olhar para todos.
É preciso negociar uma solução pacífica, democrática e definitiva para o conflito em Cabinda. É preciso ouvir as pessoas e conciliar as suas aspirações com as do país inteiro.
A manipulação de procedimentos e resultados eleitorais praticadas até aqui firmam a convicção de que a liderança do MPLA quer para Angola um capitalismo de partido único e uma democracia que não produza alternância, que encara eleições como um ritual, cuja função é revestir, com as aparências da legalidade, a “vitória anunciada” do partido do governo, a qualquer custo e por qualquer meio.
Angola já rejeitou no plano formal este modelo de governação em 1992 e também em 2002. O passo que falta para Angola tornar-se de facto um Estado de Direito Democrático é garantir que as eleições deixem de ser um ritual controlado pelo Partido Estado; e passem a ser eleições democráticas, livres e justas, que reflictam sempre e só a vontade soberana do povo.
Em 2017, chegamos ao cúmulo de ver uma CNE dividida a anunciar resultados que não produziu. Ficou confirmado que a CNE serviu e tem servido apenas de testa de ferro das ordens superiores. Até hoje, ela não tem os resultados eleitorais reais, mesa por mesa, assembleia por assembleia, porque são manipulados.
Importa recordar que os problemas de Angola dizem respeito a todos os seus filhos, incluindo os que vivem na diáspora e também aos investidores estrangeiros que escolheram Angola como seu local de residência e àqueles que investiram aqui o seu dinheiro, contando com o justo retorno do capital investido.
Por isso é normal que as forças democráticas do País conversem com os investidores e lhes reafirmem garantias de estabilidade. Eles sabem tudo o que se passa em Angola. Sabem coisas que o povo não sabe. Porque é lá no estrangeiro que estão os dinheiros de Angola, é lá que se cozinham os contratos que o povo não conhece.
Folha 8 com Lusa